Passos apressados ecoavam pelo escuro corredor de pedras. As tochas
pontuais rascunhavam a sombra de um jovem guarda. Com capa branca, armadura
leve, sem elmo ou escudo, portando como defesa apenas uma espada curta no
cinto. Era possível escutar a sua respiração já cansada, talvez uma longa e
intensa jornada o desgastara.
- Parado aí! – disse a sentinela de patente mais alta que tomava a frente da
porta enquanto segurava com uma das mãos a espada e a outra a bainha.
- Carta para o Coronel! – respondeu o jovem sem diminuir a velocidade.
Conforme se aproximava da porta, mais clara era a intenção do guarda em
detê-lo. Passo por passo, o jovem reduziu a carga para poder mostrar o envelope
preto, com detalhes brancos. O guarda logo entendeu da urgência que se tratava,
não era preciso mais dialogar. Era algo maior do que suas responsabilidades
permitiam-lhe saber.
- Rápido! Quarta porta à esquerda! – Ainda desajeitado, saiu da frente abrindo
a porta o mais rápido que pôde.
A porta de madeira escura, com barras de ferro em diversos pontos confirmava o
seu destino. Qualquer pessoa em uma posição de comando elevada teria uma
estrutura superior à dos demais membros.
Batidas fortes na porta aparentemente maciça. Um breve período de silêncio e
novamente a porta foi usada para chamar a atenção de quem estava dentro do
cômodo. Logo o som de um molho de chaves crescia e não tardou para que o
bagulho da tranca sendo aberta rompesse o silêncio do corredor.
- Pois não? Em que posso ajudá-lo? – Atendeu em um tom amistoso a criatura
baixinha, com uma barriga conquistada pela falta de exercícios e o avanço da
idade, de pele azul celeste, cabelo e costeletas tão brancos quanto a neve que
cai sobre as montanhas.
- Coronel, entrega urgente para o senhor! Acabou de chegar! – Respondeu agitado
o rapaz enquanto entregava o envelope. Sabia da urgência da sua missão, não
tinha mais o que fazer.
- Obrigado meu jovem. Pode se retirar. – Acenou com a cabeça a fim de expressar
de que a ordem fora entendida. Imediatamente fechou a porta com uma das mãos
enquanto olhava para a outra com o envelope negro.
O pequeno homem caminhou pelo cômodo sem dizer nenhuma palavra enquanto
aproximava-se da sua mesa. Tinha noção de que independente do que estava
contido ali, não seriam boas novas e logo começou a procurar por alguma
iluminação próxima à ele.
Depois de trazer para mais perto de si uma vela, abriu o envelope. Era preciso
ler com muita calma. A situação não permitiria erros.
Coronel,
Estou escrevendo esta carta pois a situação exige muita urgência. Fomos
atacados nesta última noite de Lua minguante por um grupo de selvagens.
Perdemos diversos bons cidadãos pois quase não possuímos armas e tão pouco
treinamento. Precisamos de ajuda imediata.
Prefeito Gaël.
- Como pode uma vila dentro do
círculo tático ser atacada? Preciso encontrar uma patrulha para guarda-los
enquanto formalizo os pedidos de tropas. – questionou-se cerrando os lábios,
esculpindo uma máscara de dúvida em seu semblante.
Colocou a carta na mesa e tomou
fôlego. Sabia que precisaria agir com urgência, mas tinha noção de que o
esforço valeria a pena. Assim, levantou-se arrastando a cadeira para trás. O
som reverberou pelo cômodo, extinguindo-se lentamente nas sombras das quintas.
Os armários com livros de mapas, protocolos e plantas baixas escondiam o real
tamanho do cômodo.
Abrindo uma portinhola no meio do
grande armário repleto de livros, haviam quatro prateleiras com uma vasta
coleção de frascos. Devidamente etiquetados, fracos com venenos raros,
antídotos e essências perdiam destaque para um único que ficava isolado no
canto. Feito de porcelana azul e ornado com sutis linhas douradas, era o único
de todos que não possuía etiqueta.
Com o frasco em mãos, caminhou
até a prateleira de pergaminhos em branco. Pegou um e estendeu-o sobre a mesa,
usou um livro largo em um dos lados que teimava em se enroscar novamente e
abriu a primeira gaveta para pegar uma grossa luva de couro que estava junto
com seu par.
Já com a luva vestida na mão
esquerda, colocou o fundo do frasco próximo à chama de uma vela que estava
próxima. Não demorou muito, só queria aquecer o mínimo possível para poder usar
o líquido.
Quando sentiu que o tempo
necessário fora o suficiente, deixou pingar quatro gotas no meio do pergaminho.
Com calma, tampou o frasco novamente e o repousou sobre a mesa. Uniu os dedos
na forma de um bico de pássaro e os levou na direção da mancha vermelha que
fora se formara. Ao tocar nela, abriu seu dedo polegar e mínimo, girou o pulso
e assim desenhou um círculo envolta do centro, conectando as duas partes pela
linha formada na abertura dos dois dedos.
Com a mão esquerda concentrou um
pouco de mana. A luminosidade azul não fora forte o suficiente para vencer o
amarelo das velas, mas o leve contato com a o desenho fez com que uma forte luz
branca preenchesse o ambiente todo. Um zunido de algo sendo lançado fez com que
um portal fosse aberto sete passos à frente da mesa. Do outro lado era possível
ver a circulação de pessoas de um lado para o outro.
O coronel caminhou até o portal e
como quem anda por uma casa com poucas portas, só sentiu que trocara de cômodo
devido a profusão de novos estímulos. Os cheiros diferentes, os sotaques de
todas as partes do reinado, misturados com o vento corrente que tornava o
ambiente um pouco mais frio do que a sua sala, fizeram com que o experiente
Coronel demorasse alguns instantes para se situar dentro daquele caos.
- Senhor, o que houve? –
Perguntou a jovem alta, vestindo farda cinza escura, bota preta quase até o
joelho, similar à um soldado pronto para o combate. Sua pele revestida de
escamas verde-folha trazia mais contraste ainda com seu cabelo cor de laranja,
preso em um rabo de cavalo perfeitamente alinhado.
- Recebi uma carta de Dagarkin.
Nela está dizendo que sofreram um ataque no último dia de lua minguante e
parece que alguns cidadãos foram mortos no confronto. – mantendo o semblante
fechado, enquanto falava avaliava a reação da jovem, a seriedade em momentos de
crise é o que mais chama a atenção nos umlilo. Ficaram em silêncio por alguns
instantes enquanto mediam a seriedade daquela notícia.
- Alguma notícia do santuário? –
perguntou a tenente com uma pitada de ansiedade para a resposta.
- Não dizia nada carta, mas provavelmente
não sofreu com esse ataque. – respondeu impassível o Coronel tentando esconder
a pressa.
- Isso tem dois dias! Muito estranho
nenhuma patrulha que estava por perto notou a movimentação de invasores. –
comentou enquanto virava-se para um grande mural com o mapa do reinado marcado
com diversos pontos referentes à localização de sentinelas. Começou a avaliar
se houvera alguma falha na patrulha enquanto vasculhava sua memória. –
Subtenente Carnys, localize imediatamente a tropa mais próxima a Dagarkin!
- Imediatamente senhora! –
respondeu o homem esguio, de pele violeta que vestia uma roupa azul escura e um
cinturão marrom com detalhes dourados.
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